A Câmara Municipal de Campo Grande/MS,

APROVA:

Art.1º Fica assegurado o direito de “visita virtual”, através de chamadas telefônicas e/ou vídeo-chamadas por aplicativos de telefone celular, aos familiares de pacientes que estejam internados na rede de saúde pública ou privada do Município de Campo Grande/MS, com diagnóstico de infecção pelo novo Coronavírus – COVID-19, em Unidades de Tratamento Intensivo e Unidades de Internação – enfermarias e apartamentos.

§ 1º A eleição da modalidade ligação telefônica ou vídeo-chamada será feita pela equipe de assistência à saúde do paciente obedecendo a critérios técnicos e clínicos que serão, obrigatoriamente, explicados aos familiares.

§ 2º O direito à visita virtual será extensivo aos pacientes sedados ou com os quais não haja a possibilidade de comunicação efetiva, caso seja este o desejo da família, inclusive para efeitos de despedida, no caso de morte iminente.

Art. 2º Para efetivação do disposto nesta Lei, a instituição de saúde deverá:

I – identificar o familiar responsável pela efetivação da visita virtual, coletando nome completo e 1 a 2 números de telefone, incluindo aplicativos de troca de mensagens instantâneas;

II – explicar a rotina de comunicação, horários das visitas virtuais, fluxo de dúvidas e medidas que serão tomadas em caso de eventuais indisponibilidades técnicas temporárias para o responsável principal;

§1º A participação na visita virtual, seja pelo recebimento de chamada telefônica ou pela realização da chamada de vídeo dependerá da vontade do paciente em realizá-la, sempre que este for admitido consciente no serviço de saúde, devendo a pratica ser incentivada pela equipe de saúde responsável, respeitando-se a autonomia do paciente.

§2º Nos casos em que os pacientes sejam internados inconscientes ou não saibam informar um contato de familiar ou pessoa próxima, deverá ser realizada a busca ativa por assistente social da unidade.

Art. 3º Caberá às instituições de saúde a viabilização de protocolos sanitários de biossegurança visando à implantação do disposto no caput do Art. 1º, com o objetivo da proteção de todos os envolvidos, inclusive da equipe de profissionais da área de saúde.

 Art. 4º A periodicidade da visita virtual será estabelecida observados critérios técnicos e clínicos elencados pela equipe de assistência à saúde do paciente e explicados de forma breve e simples aos familiares, não podendo exceder ao prazo máximo de uma visita por semana, com duração máxima de 10 (dez) minutos.

Art. 5º Deverão ser utilizados para realização da visita virtual através de vídeos-chamadas, aparelhos celulares fornecidos pelos pacientes ou por seus familiares, objetivando garantir a comunicação entre os mesmos.

Art. 6º Esta Lei entrará em vigor na data de sua publicação.

Sala de Sessões, 17 de maio de 2021.

JUNIOR CORINGA

Vereador

JUSTIFICATIVA

Ainda são incalculáveis as consequências da Pandemia pelo novo Coronavírus – COVID-19 para a população brasileira, porém já é possível a observação de novas demandas sociais que surgiram, ensejando dos legisladores a criação de mecanismos legais que as amparem.

No campo sanitário, são diversas as necessidades que foram geradas e que estão as diretamente relacionadas aos modelos de tratamento em saúde oferecidos aos pacientes com COVID-19.

O caso amplamente divulgado pela mídia local sobre a luta da família do Sr. Paulo Roberto Canini, já com prognóstico de fase terminal da doença, pelo direito de se despedirem deste ente querido ao menos por meio de uma chamada telefônica, evidenciou uma lacuna no regramento interno atual das instituições de saúde, que trás consequências emocionais irreparáveis: impedimento de visitas presenciais e ausência de meios alternativos que contemplem este direito do paciente e seus familiares. Os familiares alcançaram medida liminar judicial, que lamentavelmente não foi cumprida a tempo pela unidade hospitalar antes do falecimento do Sr. Paulo.

O advento da Lei nº 8.080/1990, promulgada no ano de 1990, com posterior regulamentação dada pela Política Nacional de Humanização – HumanizaSUS editada pelo Ministério da Saúde em 2003, trouxe à tona os aspectos humanísticos que necessariamente precisam ser incorporados à rotina de atenção à saúde, visto que o “compromisso ético-estético-político da humanização do SUS se assenta nos valores de autonomia e protagonismo dos sujeitos, de corresponsabilidade entre eles, de solidariedade dos vínculos estabelecidos, dos direitos dos usuários e da participação coletiva no processo de gestão.” (Política Nacional de Humanização do SUS: o que é, como implantar, uma síntese das diretrizes e dispositivos da PNH em perguntas e respostas, Ministério da Saúde, 2010).

Compreendendo os aspectos psicossociais da humanização da assistência à saúde, as visitas periódicas a pacientes internados têm um papel fundamental na recuperação, pois garantem aos pacientes a manutenção do vínculo afetivo e o contato, ainda que restrito, com o ambiente externo.

Diversas pesquisas têm sido publicadas, comprovando os efeitos benéficos aos pacientes no tocante às visitas de familiares, indicando inclusive menor tempo de recuperação, maior índice de altas efetivas e maior engajamento ao tratamento proposto pela equipe de saúde responsável. Assim, diante da impossibilidade da efetivação de visitas presenciais devido aos riscos de contágio inerentes ao COVID-19, caminhos alternativos têm sido implantados em algumas unidades hospitalares com resultados igualmente benéficos.

De outubro a dezembro de 2020, o Projeto Conectando Vidas foi desenvolvido pela equipe do Hospital Sírio-Libanês no Hospital Regional de Mato Grosso do Sul em Campo Grande e os resultados práticos benéficos foram amplamente divulgados por ambas as instituições. Através de tablets conectados à internet, familiares que não viam seus entes queridos hospitalizados há bastante tempo puderam restabelecer esse vínculo e reduzir a ansiedade por notícias que, até então, vinham apenas através de relatórios médicos técnicos e padronizados. Este projeto trouxe a certeza de que a implantação sistemática de “visitas virtuais” é perfeitamente viável do ponto de vista técnico e extremamente eficaz do ponto de vista clínico aos pacientes.

Assim sendo, este Projeto de Lei não carrega em seu cerne nenhuma inovação jurídica e muito menos inclui qualquer obrigação inédita aos estabelecimentos de saúde, mas tão somente garante a sistematização de uma rotina imprescindível e já aplicada, ainda que de forma incipente, em algumas destas unidades, corroborando, com o disposto na Lei Orgânica do Município, em seu Artigo 138 e Artigo 139:

 Art. 138. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução de risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

[…]

Art. 139. São de relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao Poder Público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle, devendo sua execução ser feita, preferencialmente, através de serviços oficiais e, supletivamente, através de serviços de terceiros.

Quanto à prerrogativa da iniciativa, a Lei Orgânica do Município dispõe ainda que:

Art. 22. Cabe a Câmara Municipal, com a sanção do Prefeito, não exigida esta para o especificado no art. 23, dispor sobre todas as matérias de competência do Município e especialmente:

[…]

XIV – organização e estrutura básica dos serviços públicos municipais;

Diante da escassez de recursos públicos municipais para a efetivação do que dispõe este Projeto de Lei, o Executivo Municipal poderá realizar parcerias com a sociedade cível tanto para viabilizar a abertura de um amplo canal de doações, para que empresas, entidades do terceiro setor e cidadãos possam contribuir com equipamentos tais como celulares, tablets, roteadores, dentre outros pertinentes à operacionalização das ligações telefônicas e chamadas de vídeo. O canal poderá contar, ainda, com a eventual cessão de materiais apreendidos por órgãos da segurança pública, maximizando o aproveitamento de recursos em posse do Estado. Uma vez disponíveis meios tecnológicos eficazes, de simples e amplo domínio – sem a necessidade de promover cursos específicos para sua utilização –, é natural que os mesmos sejam aproveitados pelos usuários das ações e serviços públicos de saúde.

Em última análise, a aprovação deste Projeto de Lei pelos nobres pares trará à população de Campo Grande a garantia de que seus direitos legais serão preservados nos casos de internação em serviços de saúde por COVID-19, bem como garantirá que casos como o do Sr. Paulo Roberto Canini nunca mais tornem a acontecer nesta capital.